#10 - SABORES

Há casas em que se usam muitas especiarias. Cozinhas onde não se faz puré sem noz moscada, onde não se faz salada sem oregãos, onde não se faz molho sem ter meia dúzia de grãos de pimenta. Na cozinha da minha casa não é assim. Põe-se louro e salsa de vez em quando, sal, colorau e pouco mais.

Quando cheguei a meio do último ano do meu curso, lançaram-me aos lobos, que é como quem diz que me mandaram para estágio, numa produtora de televisão, na capital, onde conhecia pouco mais do que o zoo e o oceanário. La vai a Catarina, de trouxa aviada, partilhar casa com pessoas que não conhece, mas cheia de vontade e de fome de mundo. Para a maior parte dos meus colegas, nesta altura do campeonato, mudar de cidade e partilhar casa e problemas com desconhecidos não era nada de novo. Mas para mim, coimbrinha, a estudar na minha cidade a morar com os papás, tudo foi uma aventura.

A primeira coisa em que reparei, na primeira noite em que fiquei "sozinha" naquela casa foi num cesto, ao lado do fogão, cheio de frasquinhos de vidro com tampas coloridas. Estava prestes a descobrir o vastíssimo mundo das especiarias. Achava eu...


O tempo foi passando. Fui-me familiarizando com as restantes pessoas que habitavam aquela casa e ganhei à vontade para observar os cozinhados deles. Às vezes, partilhámo-las à mesa. Foi algures nesse tempo que descobri o caril. A R. adorava e pôs-me tanta curiosidade no corpo que fui obrigada a experimentar. Daí em diante, na maior parte das vezes, o meu arroz era amarelo.

Não aprendi a usar especiarias, não sei com que combina bem o cebolinho ou o açafrão, mas o caril... esse sei bem ao que sabe e onde gosto dele. Hoje estou muito grata pelo sabor a caril, pelas memórias que me assolam sempre que ele toma conta das minhas papilas gustativas e por aqueles três meses de partilha e fraternidade. Obrigada R., obrigada M., tenho a certeza que se fôssemos ingredientes e temperos combinaríamos todos muito bem uns com os outros.

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